terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Viagens...

A caminho da praia que fica a quase 5 horas de viagem (em condições normais)... O carro onde viajava com as minhas amigas, estragou-se (ficou sem óleo dos travões, porque os muitos buracos estragam os amortecedores e estes, estragados, rompem os tubos). Depois de alguns telefonemas de uma assistência em viagem feita de amigos, parámos no meio da estrada numa povoação onde havia uma "oficina".
Fiquei na berma a ver os miúdos que vinham da escola e as mulheres que vinham ou iam para algum lado... a dada altura passaram duas mulheres de burca. Uma das senhoras cumprimentou um dos homens que fazia parte do ajuntamento que arranjaria o carro.
Depois de passarem, ele disse num português muito "macarronico" que eu ouvi mais ou menos assim:
- Sabe, tem de ser ela a cumprimentar, eu conheço-a mas se ela não me cumprimentar eu não sei que é ela.
Sorri com aquela cara de quem espera mais conversa mas que deixa o outro seguir como e para onde quiser... Ele continuou:
- Sabe ela tem de andar assim, porque assim ninguém a vê, só ela é que pode ver por aquela (e fez o gesto... ficou um silêncio... imagino que deixou de falar da mulher e começou a filosofar)
- Dizem que se os homens vêm a Beleza se apaixonam por ela. E por isso as mulheres devem andar tapadas. Assim ninguém vê.
Eu sorri, queria mais conversa mas não queria perguntar fosse o que fosse, não me queria mexer, nem ouvir a minha voz num português tão diferente daquele, que iria mudar a conversa porque efectivamente não falamos na mesma língua e eu levaria a conversa para o meu horizonte.... e só queria ouvir o momento... ouvir aquele homem que trazia na mão dois tubos de cola numa embalagem novinha, de t-shirt amarela lavada, que sabia que no dia seguinte o Real Madrid jogaria com o Barcelona e que o Cristiano não está na sua melhor forma.
Faria ele mesmo, isso à sua mulher?
Pensará ele também, que quando alguém vê a Beleza se apaixona por ela?
(...)
Cada dia me parece mais claro que uma parte significativa de nós (ou de mim) não se consegue converter à Beleza! Por isso não se deixa, propositadamente, apaixonar por nada mesmo que tudo ande nu.
A burca integral como forma de evitar paixões é uma visão... hummm... de certa forma poética... porque pressupõe que as pessoas se apaixonam efectivamente pela Beleza e mais ainda que todas as mulheres são belas.
Uma coisa é certa, percebi na sexta-feira que a iniciativa de uma mulher de burca de comunicar está nas mãos dela... pode ser invisível se quiser.
Ouvir falar de Beleza e paixões... perdida no nada... a caminho de uma praia deserta ao lado de um carro avariado... é uma coisa que me faz sorrir, agradecer e calar...
Enfim... um dia escrevo sobre isto se a inspiração surgir e no fundo não foi nada de especial... foi tudo normal fluido e ajustado como teria sido em Espanha, Itália ou Portugal... apenas diferente, um pouco mais sujo, sem macacos hidráulicos, muitos homens a ver, sem preços afixados... e sem montras para passar o tempo ou bolachas para comprar... só bananas grandes a 75 francos e a hipótese de sermos vistas pelos olhares curiosos dos miúdos que vinham da escola e das senhoras que passavam vestidas com negras burcas ou panos coloridos... afinal as estranhas naquela paisagem éramos nós.

E tal como a senhora de burca, estava nas minhas mãos dar conversa ao homem, e dizer-lhe quem sou, através da minha opinião sobre beleza ou táticas futebolísticas... mas nestes sítios apetece-me mesmo é ser invisível... ver sem ser vista. Talvez um dia compre uma burca.

 😲😛😘







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