terça-feira, 13 de julho de 2021

Dez quilos de tempo e unhas de gel.

Ano: c. 1636-1638 Técnica: óleo sobre tela Dimensões: 221 x 181 cm Localização: Museu do Prado, Madri, Espanha
As Três Graças, Peter Paul Rubens 
1636-1638, óleo sobre tela, 221 x 181 cm
Museu do Prado, Madrid, Espanha
Era cedo e eu acordei a pensar no tempo, não no sol que me entrava pela janela depois de uma noite de chuva, mas no tempo que normalmente se mede com ponteiros movidos a rodas dentadas ou mecanismos complexos,  ainda que, mais simples que esta manhã silenciosa na qual me recusáva a ver as horas.

Podemos medir o tempo de tantas formas, gosto quando o medimos em primaveras pelos aniversários. Nas margens do Geba há quem tenha o tempo de uma árvore, fazendo ecoar a confidência: sou tão velho como aquele pé de mango. Emociona-me esta poesia que mostra que há vidas que dão abrigo a pássaros e morcegos, dão frutos que alimentam os da casa, mas também os desconhecidos que se aproximam na estação certa.  
Há medidas menos bucólicas como o crescimento das unhas de gel ou da raiz de brilhantes melenas alvas em cabelos pintados de cor garrida. O crescimento dos cabelos e das unhas depende de cada um, fazendo prova desta entidade subjetiva e orgânica que tentamos todos os dias cronometrar. 
Também meço a tempo pelo tamanho das crianças, por exemplo a minha primeira separação tem a robustez, a força e a esperança do meu sobrinho mais velho, a minha segunda separação tem a leveza, a perspicácia e a irreverência da minha sobrinha mais nova. 
Também medimos o tempo em pesos acumulados e armações de óculos. 
Nos dias em que me sinto dez quilos mais velha, olho para as figuras de Tintoretto ou de Rubens e desejo viver nas suas salas no Prado e não ser mais exposta a desfiles de moda ou anúncios de revistas, afinal para o tempo também são precisas referências, inventando um ritmo que se adapta e acolhe novas formas.  
Medimos o tempo pelos alertas do Facebook ou pelos lembretes do Google... Nos dias em que recebo uma memória "neste dia há quatro anos", olho para a imagem e na maior parte das vezes não reconheço o calendário, tanto pode ser por excesso como defeito. Quando me liga uma amiga com quem não falo há meses e ficamos duas horas em whatsapp que partilha conversas e afazeres, parece que a última vez que falámos foi no dia anterior. E há pessoas com quem tivemos tanto contacto e ainda assim quando se aproximam parecem alienígenas desconhecidos.  
Sim, é clichê falar do tempo, mas em que outro texto eu poderia escrever unhas de gel sem falar de caixas de supermercado ou estética de jogadores da bola? Sou eu a tentar ter graça :-)

25 de abril! Sempre!

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