terça-feira, 25 de abril de 2023

Encontros

Ao cair do dia ponho em ordem as respostas por dar às mensagens digitais que pedem tempo e coração à pena, que é como quem diz ao teclado.
É bom ter espaço para poder partilhar sem distância com quem está longe. Uma evidência que é medida em quilómetros deixa de ser mensurável se medida com o coração.
Num destes dias procurei por algum tempo uma palavra que sintetizava o que tinha sentido num encontro recente com uma grande amiga. Por mais que procurasse não encontrei nas letras que tinha uma conjugação ajustada ao momento. Escrevi várias e assim seguiu a mensagem fiel ao sentir e ao momento. Adormeci agradecida.
Na manhã seguinte, ao me aperceber dos primeiros sinais de luz a entrarem pela janela e ainda no limbo dos sonhos que nos acordam para a vida, a palavra veio delicada e sorridente ter comigo. Retribuí o sorriso ao ver chegar sem esforço aquilo que poderia ter escrito no dia anterior.
A palavra era "comunhão" e foi ela que me encontrou adormecida e sonhadora naquela manhã de feriado.
Os nossos tempos talvez sejam balanceados entre este procurar sem preguiça e este deixarmo-nos encontrar sem medo.
Abandonarmo-nos à confiança do encontro pode ser um desafio neste tempo de produtividade e imediatismo, porque exige mais descanço e presença no sonho que força na vontade dos músculos.
Confio nos encontros.

segunda-feira, 17 de abril de 2023

Viagens vs tatuagens

As viagens são como as tatuagens. Depois da última queres fazer logo outra. Quando aterras naquilo a que chamas casa, tens mil planos para novos horizontes.
Há uma diferença entre as tatuagens e as viagens, as primeiras mantêm-se quase inalteradas. Com os anos podem precisar de retoques ou de um "apagamento" (qualquer uma das intervenções é dolorosa).
As viagens mudam de forma ao longo do tempo, os contornos alargam ou estreitam conforme as entranhas se transformam e a memória as constrói, no meu caso esse processo não é doloroso, transforma todo o peso das malas ou das noites à espera de transporte em momentos leves sem atrito de qualquer gravação a ferros.
A tinta de que são feitas as viagens é muito diferente da tinta de que são feitas as tatuagens, mas ambas são viciantes.









Reencontros

No espaço de dois dias encontrei em sítios e contextos diferentes duas pessoas que não via há mais de 20 anos. O primeiro momento é aquele encontro de olhares de alguém que se reconhece, mas a quem a memória não é suficientemente rápida para decifrar factos, apenas sensações.
Estes poucos segundos são de curiosidade e incómodo. Normalmente são cortados com um sorriso (eu pelo menos não consigo estar muito tempo a olhar fixamente para uma pessoa sem estabelecer com ela alguma interação), rio para ganhar tempo.
Em ambos os momentos a pessoa à minha frente disse o meu nome e sorriu também.
Uma delas disse: "sabes Cláudia eu sabia que te conhecia, mas foi ao ver o teu sorriso que o teu nome saltou, os teus olhos continuam iguais."
Para uma pessoa que muda várias vezes de cor de cabelo, que foi mudando ao longo dos anos, que vive longe dos sítios que a viram crescer este tipo de encontros é uma benção.
Alguém me reconhecer pelo sorriso é de um conforto sem explicação.
Quero ainda fixar-me naquela fração de segundo que o cérebro não consegue apresentar factos, mas que o coração assegura que o que viveste com aquela pessoa foi bom, a sensação que vem ao de cima é de alegria e nessa infima fração de segundo sabes que já te riste com a pessoa, que ela te acolheu, te desafiou, que gostas dela. Podes não saber o nome nem fixar na linha cronológica o tempo exacto que partilharam, mas sabes, sem dúvida, que é um reencontro bom. Pode ser desta dimensão ou de outra, não precisas de factos para sorrir e agradecer o reencontro.



Sofia Areal

A vida nos filmes e a Juliette Binoche

Há dias vi o filme Clara and Claire com a Juliette Binoche que me tocou.
Acredito que as aplicações de encontros têm coisas boas. Democratizam os acessos.
Não se conhecem só as pessoas da mesma aldeia, da mesma idade, da mesma tribo ideológica, da mesma escola ou do mesmo trabalho, abrem-se novas possibilidades.
Mas a abordagem por "mensagem" é uma abordagem plana, em que lemos mais o que somos do que o que o outro é. Aqui a possibilidade de engano (ou de ilusão) é elevada ao seu expoente máximo.
Há pessoas que nas primeiras abordagens querem ouvir a voz do seu interlocutor o que dá (literalmente e metaforicamente) volume ao outro. Na voz adivinhas formas, trejeitos, origens, velocidades, mas ainda continuas no teu mundo. É bonita a ideia das pessoas gostarem de ouvir a voz umas das outras.
No meio disto tudo estão as carências e as projeções de todos os que vão a jogo com mais ou menos responsabilidade afectiva.
O filme Clara e Clare é surpreendente, por isso, tem diferentes níveis de leitura e a mim enquanto mulher tocou-me bastante.
A intimidade que podemos ter a falar com um desconhecido on-line é de uma superficialidade e facilidade surpreendentes, ao "fundo" só conseguimos ir com a presença, pois só ela nos permite podemos ser agarrados.
Acredito que o que dá densidade às relações são os encontros. Corpo e tempo conjugados no presente do verbo estar.




25 de abril! Sempre!

Uma amiga que vai descer a avenida da Liberdade daqui a pouco e não é de missas, convidou-me para uma missa. Encontrando um padre amigo numa...