sexta-feira, 27 de julho de 2018

Sinais...

Procurava o Centro de Saúde. Estava na rua certa não conseguia encontrar era o sítio.
Percorri aquilo que mais tarde percebi ser metade da rua, quando, pensava tê-la feito toda. Não havia sinal do Centro de Saúde. Estacionei o carro no início da rua. E decidi fazer a pé o caminho feito de carro. Comecei do início da rua olhando atentamente um lado e outro à procura de placas ou sinais que me dessem pistas, que me indicassem que estava no sítio certo. Nada dava sinal. 
Parou um carro. Um homem de barba branca óculos escuros e boné chamou-me.
- O que procura menina. Anda perdida? Percebi que estacionou ou carro e vejo-a desorientada. Posso ajudar? 

Sorri para ele. - Não estou desorientada, sei que a rua é esta, mas não encontro o Centro de Saúde.

Ele continua a sorrir confirmando que estou na rua certa, de facto. - Encontra o que procura a uns 300 metros à sua direita. É um espaço bonito com árvores e até pode levar o carro. Está calor para ir por baixo deste sol do meio dia. Mas andar faz bem. Não é longe.
A sorrir deixou que eu decidisse como chegar lá, desejou-me muitas felicidades e seguiu a vida dele. Eu optei por seguir a pé e fiz o caminho confiante e alegre até ao meu destino.


Esta é uma metáfora de muitos momentos da nossa vida. Sabemos onde queremos ir, estamos perto do que queremos alcançar mas andamos à toa procurando sinais que não encontramos. E depois alguém se dá ao trabalho de chamar, de nos sorrir, de se aproximar de nós. Esse gesto de generosidade, atenção e comunicação permite que continuemos o caminho seguros e sorridentes, com o foco e com a confiança nos espaços bonitos e com sombra que nos esperam no pico do Verão. 

Tocou-me a disponibilidade deste homem, o ter abrandado o carro numa cidade onde toda a gente apita a quem vai mais devagar. Toca-me a disponibilidade de todos os abraços, de todos os olhares e de todas as palavras que me dão alento para continuar. Sem elas fazemos caminho, até podemos fazer o mesmo caminho, mas seguramente não o fazemos da mesma maneira, com a mesma alegria, com a mesma firmeza ou rapidez.
É a generosidade de quem pára e a abertura de quem se deixa ver desorientado, que permite a conexão quase mágica e invisível que faz andar o mundo de forma mais segura, alegre e confiante.
Que nunca desperdicemos uma oportunidade de perguntar: Posso ajudar? E nunca desperdicemos uma oportunidade de responder: Sim, claro que pode!

quinta-feira, 26 de julho de 2018

Dermografismo...

Um destes dias numa conversa sobre estética, depilação e pele, uma senhora perguntava-me se eu tinha dermografismo. Calei-me e ri-me pela pergunta e porque não sabia exactamente o que me perguntava. Interiormente respondi que sim, exteriormente a senhora comprovou, pelo toque, que não, e desta vez foi ela a rir aliviada.
No caminho para casa concluí que na verdade tenho dermografismo, não o dermografismo que ela me perguntou, não tenho nenhuma reação alérgica ou uma hiper-reação local à pressão que provoque inchaço ou que se deixe marcas de irritação. Tenho um outro tipo de "skin writing", ou seja, podia dizer à senhora que a vida escreve-me na pele sim.
Tenho marcas que não passam com anti-alérgicos, pomadas ou gelo. Há marcas que fui eu que desenhei, marcas tatuadas com palavras, há marcas de flores coloridas para alegrar os dias e há outras marcas que a vida deixou, arranhões que não escolhi e dos quais assumo parte da responsabilidade. Há macas de roupa apertada ou de vincos de lençóis. Há marcas de biquini e de creme mal espalhado deixadas por um sol que queima. Há marcas de Verão e marcas de Inverno, cicatrizes, manchas e olheiras.
Há sinais escuros, pontinhos pretos com e sem relevo que mais parece o inverso de um céu estrelado, pontinhos de diferentes tamanhos que muitas vezes me apetece unir. Pontinhos com os quais crio as minhas próprias constelações. E nesse sentido tenho dermografismo sim, porque esses sinais ou desenhos, marcas, cicatrizes ou nódoas negras não são sempre os mesmos, vão crescendo ou mudando com o tempo, e vão orientando-me o caminho como as estrelas. Sei, a partir das marcas que carrego, o que me amarrota, queima ou dá cor, sei principalmente para onde quero ir. Oriento a minha navegação por elas, mostram-me o norte e mostram quando é tempo de parar.
A pele que visto serve-me na perfeição e conta uma história que só eu sei ler.


segunda-feira, 23 de julho de 2018

Janelas...


Da minha janela vêm-se outras janelas. Dou por mim a pensar o quanto gosto de janelas. Vejo uma mulher a vestir-se, vejo camas feitas e por fazer. Vejo que neste frenesim de alugar quartos no centro de Lisboa os chariots ganham espaços e dão espaço aos quartos pequenos habitados por gente bonita. Gente que não tem problemas em fechar janelas, gente que deixa que a luz e os olhares possam entrar em espaços que dantes eram muito mais íntimos. Gosto de janelas e de portas... Gosto portanto de construções, gosto do que se edifica e se abre ao mundo.
É mesmo a abertura do edificado que me encanta. Construir para a abertura desafia, interpela e cria relação. Uma relação sem palavras. Uma relação sem toque. Uma relação de luz e de olhar. É por isso que não fecho as minhas janelas. Deve ser por isso que acordo com a luz do dia e não sinto necessidade de estores na maior parte dos dias. Estes são os dias bons, os dias em que a luz entra sem barreiras e me ilumina os sonhos e os desejos de ver cada vez mais longe e mais claro onde quer que me construa.

segunda-feira, 16 de julho de 2018

Portas...

Há dias na vida em que fechar a porta com as chaves lá dentro é a melhor coisa que pode acontecer. É um acto duro e solitário, feito com coragem, consciência e intencionalidade, um gesto contra-natura porque não ficam lá dentro por esquecimento, descuido ou desatenção. Ficam dentro porque não queres voltar a abrir aquela porta. Porque aprendeste na carne que não faz sentido voltar a entrar em espaços que não estão preparados para te acolher.
Não é o mesmo que sair para comprar cigarros e perder-se no mundo com as chaves no bolso. Sempre podes voltar e sempre alguém te esperará.
Sair e deixar as chaves lá dentro é entrar no mundo de mãos livres para agarrar o novo e o inesperado, sem pontas por coser ou rabos por esfolar.
Há dias na vida que temos de fechar portas para nunca mais as abrir, sem "mas", "talvez", ou "quem sabe" e seguir em frente sem nada nos bolsos, sabendo-nos apenas a voltar para nós próprios e para o Amor que nos espera sempre, sem portas.


Conversas que tenho comigo

Há uns dias ouvi falar sobre públicos de cinema num sítio onde não há uma sala com programação regular ou onde os filmes não se apresentam ...