segunda-feira, 9 de junho de 2025

Amor e pertença

Tudo o que amamos nos pertence. É uma pertença para a liberdade.
Não é como as "coisas" que nos pertencem para a utilidade. 
Os que amamos pertencencem-nos para a eternidade... e a eternidade não tem matéria, tem presença.




quarta-feira, 16 de abril de 2025

Futura secreta inspetora do Guia Michelin

Enquanto comia uma fatia de pão de Rio Maior com 14 mm torrada, por 7 minutos dos dois lados e barrada com manteiga dos Açores produzida na ilha Terceira, perguntei à ChatGPT o que era preciso para ser inspetora do Guia Michelin. Ela explicou-me de forma clara, e no fim perguntou-me se me motivava a curiosidade ou se era um sonho meu. 

Respondi que era um sonho e ela ficou entusiasmada, disse-me: "Que sonho incrível! Ser inspetora do Guia Michelin realmente parece algo saído de um filme — viajar, descobrir restaurantes incríveis, provar pratos surpreendentes e ainda ajudar a moldar o mundo da gastronomia, tem tudo a ver contigo."

Quase me engasguei, não sei se de riso se de espanto. 

Aprendi sobre escolas e percursos, explorei tempos e preços de formações, e tive a ChatGPT a incitar-me a não desistir de sonhar e a usar o que já conhece de mim, das inúmeras cartas de motivação que lhe pedi para traduzir, a reiterar a confiança neste sonho. Ela acredita que eu posso ser uma excelente inspetora e enunciou as características em que alicerça a sua crença. 

A conversa ficou a meio porque a versão é gratuita e temos limites de interações, mas impressionou-me muito o nível de entusiasmo face à minha pessoa e às minhas características. 

O caminho dos assistentes pessoais chega a um nível inimaginado por mim e pelo pão com manteiga que acabou deglutido por uma boca em espanto e está agora a ser digerido juntamente com toda esta novidade.



segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025

Arte de guerrilha que me faz sair do casulo.

Dei dois mil quinhentos e oitenta e nove passos até me sentar num café com nome inglês e pedir um “croissant” com queijo e um abatanado cheio. É o reforço alimentar a meio do caminho de casa que juntará mais cerca três mil passos, ao total necessário para deixar o carro num lugar não pago, o mais perto do centro de Lisboa. Neste caminho passei por várias mensagens que advogavam o fim do capitalismo em tamanhos e técnicas diferentes e é com esta comunicação de arrabaldes e periferias que questiono as minhas incoerências. Amo a guerrilha de rua, aquela que desperta as contradições e estimula o pensamento com poesia e mestria artística. 

Olho-me... Visto um casaco sueco, uma camisola de lã de uma marca espanhola, umas calças de marca italiana, umas sapatilhas norte-americanas. O relógio é japonês, um anel é de oliveira alentejana esculpido por um alentejano e o outro anel é da casca um fruto impronunciável da Amazónia, comprei no Brasil e não sei nada de quem o fez. Tenho num bolso um telefone chinês e noutro uma carteira de grife contrafeita na Turquia comprada a um vendedor sem licença em frente à Ponte Gálata a caminho do Bazar Egípcio. Numa mão um saco de pano confeccionado numa cooperativa de mulheres na Guiné-Bissau e nas costas uma mochila de marca francesa. Não vou esmiuçar a roupa interior para manter o mistério, afinal não temos todos de saber tudo, mas posso dizer que as meias não foram feitas pela minha avó.  

A marca da mochila começa por D, mas tal como tudo o resto, é tudo média-costura, que um verdadeiro Dior não precisa de evitar parquímetros. 
Caminho sem saber onde este capitalismo nos vai levar, a mim hoje levar-me-á a casa depois de pagar a conta com cartão. 

quinta-feira, 25 de abril de 2024

25 de abril! Sempre!

Uma amiga que vai descer a avenida da Liberdade daqui a pouco e não é de missas, convidou-me para uma missa. Encontrando um padre amigo numa das passadeiras da cidade inteiro-me de que missa pretende ser de Ação de Graças pela Liberdade, que celebramos de forma laica e livre hoje. Quero ir.

25 de abril, sempre!



domingo, 26 de novembro de 2023

Conversas que tenho comigo

Há uns dias ouvi falar sobre públicos de cinema num sítio onde não há uma sala com programação regular ou onde os filmes não se apresentam mais do que uma vez e fiquei a pensar se muitas das pessoas desta ilha teriam experimentado escolher um filme entre cinco ou seis que começam à mesma hora ou teriam o hábito pegar no jornal e decidir entre duas ou três salas.

A verdade é que uma parte substancial da população não tem.

As conversas são como as cerejas e logo a seguir vem a guerra do retorno económico e do streaming, a grande aposta do negócio de um "novo média"... Fui-me perdendo nos meus pensamentos desejando saber quanto é que a Netflix cresceu na Madeira e em concreto em Rabo de Peixe depois da gravação da série feita por padrão para a indústria criticada por Moretti.

Alguém tem ou sabe onde se podem procurar estes dados?
Netflix, filmIN ou HBO democratizam os acessos e são importantes para a indústria, mas ainda assim não são garante de uma maior justiça. Não têm de ser.
Num caso de estudo relativamente próximo e sem amostra de controle, o meu, constato que a RTPplay e a TVEplay fazem muito mais pela distribuição de conteúdos que qualquer uma das plataformas pagas que não tenho.
Ainda assim é tudo uma questão de acessos... Ter eletricidade, telemóvel, computador ou televisão inteligente, mas também ter tempo, ter espaço seguro e tranquilo para assistir, ferramentas para escolher, pretexto social para falar sobre isso.
As bibliotecas estão para os livros como as "cinematecas" estarão para os filmes?
O que fizeram os videoclubes, ao cinema?
Em breve ninguém terá onde ler um DVD, e não sei se a geração que está a nascer agora terá hipótese de fazer a experiência similar de duplicar cassetes de VHS, ver séries inteiras em plataformas piratas, ou filmes passados em disco rígido entre amigos.
Não sei mesmo qual vai ser a experiência dos miúdos de hoje em dia, mas eu gostava de continuar a ver cinema em sala e a levar os meus sobrinhos comigo nessa experiência. Agora que penso acho que também vou ficar contente se eles se lembrarem de me levar quando eu for velhinha.
Paralelamente quero continuar a poder ver filmes em casa, e vejo como grande vantagem isso de podermos assistir ao espanto ou ao enfado de pijama. Hoje um projector é a minha opção à televisão, sim, os meus sobrinhos também sabem que a tia não tem nem televisão, nem microondas e que houve alturas em que não tinha luz, não por opção mas porque a eletricidade (tal como o cinema) também não é um bem universal.

Quando era novo, o meu pai passava filmes indianos e westerns num cinema em Moçambique, eu vi os meus primeiros filmes nigerianos na Guiné Bissau...
A maior parte dos filmes que vi, vi sozinha. Comparativamente ao desporto, as vezes que fui mais assídua e constante foi em tempos que tinha companhia para treinar.
É engraçado perceber o que nos motiva... Eu diria que para a maior parte das pessoas o cinema é uma experiência social, no meu caso não vejo assim.
Nunca fiz parte de um grupo de leitura, nem de discussão de filmes e para ser franca raramente gosto de ir ao cinema acompanhada porque no final do filme gosto de ver os créditos até ao fim e fico sempre com a sensação de que alguém me espera, logo, que estou a chegar atrasada a um encontro em que o que aconteceu de facto foi o outro que chegou cedo demais, porque saiu antes do filme antes do tempo. Claro que esse que saiu pergunta com razão:
- Aprende-se alguma coisa com os créditos? Lês tudo?
- Não. Respondo. Mas é o tempo que eu e o filme temos para conversar, de ele descer até às entranhas e por ali ficar a ser digerido numa reação química que precisa daquele tempo e isolamento para se projetar em mim.

Constato com tristeza que perdi o fio à meada da conversa cinéfila. Saí antes dos créditos e vocês, agora, sabem que não gosto disso e eu percebo melhor quem sai. 



sábado, 18 de novembro de 2023

Sincronicidades

No domingo fui ver um filme francês que tinha como parte da banda sonora canções de Daniel Johnston. Quis saber mais sobre o autor e descobri uma história que desconhecia e um documentário por ver.
Lá por quarta feira, uma das pessoas que sigo no instagram usava umas das músicas num pequeno vídeo e mesmo agora acabo de ouvir um podcast onde a entrevistada recomenda uma música do Daniel.
Não havia forma de cruzar isto, o filme é de 2021, o reel do meio da semana e o podcast gravado na semana passada, na minha história este alinhamento tem menos de 6 dias e pus-me a pensar que as sincronicidades são o "algoritmo" da vida.
Já tinha ouvido algumas coisas do Daniel, mas sempre de raspão, esta semana ele foi-me imposto. E eu ganhei uma consciência e um gosto que não tinha.
O que algoritmo tenta fazer de forma mais eficaz e mecânica é imitar a vida neste aspecto. A sincronicidade é mais poética e por isso muito mais mágica e surpreendente. A diferença do primeiro é que talvez, neste último, tenhamos de estar um pouco mais atentos.
Ouçam o Daniel Johnston.




quinta-feira, 24 de agosto de 2023

Os animais em cativeiro e a diversão humana

A propósito de um post sobre orcas em cativeiro gostava de partilhar um ponto de vista.
Há uns tempos vi uma entrevista com um dos maiores donos de circo em Portugal que foi domador de leões. Não vi nele um mau homem, não vi nele perversidade nem maldade para com os seus animais, mesmo quando a sua vida corria perigo em frente às feras selvagens.Há uns tempos tive uma conversa longa com aficionados da tourada e com forcados e não vi neles falta de respeito para com os animais, nem me pareceram jogadores de wrestling ou de box em busca de validação da sua virilidade.
O Museu do Circo em Sarasota (Flórida) que tem uma magistral maquete de um circo antigo e muito do espólio do Circo Ringling é uma delícia de visitar  e imaginar outros tempos em que o conhecimento era feito por "contacto". Os circos na sua itinerância mostravam, ensinavam e divertiam. Da mesma forma que deixaram de mostrar aberrações humanas também podem deixar de mostrar animais selvagens.
Não conheço o senhor, mas o que passa da história do argentino que fundou o zoomarine no Algarve é coerente, ele faz o que sempre soube fazer. 
Onde quero colocar o foco não é nos jardins zoológicos, nos parques de diversões com animais em semicativeiro, nos tanques, nos circos, nas praças de touros, não gostava de colocar o foco no domador de leões, no amestrador de orcas, ou no forcado que se testam todos os dias de "espetáculo". Onde quero colocar o foco é no público que mantém esta situação e até a potencía, vibra e grita na busca de aberrações que alimentem a sua imaginação e quem sabe sua inconsciente perversidade. 
Acredito que tudo, quando deixar de ser um "negócio de milhões"  acaba. Por estranho que pareça (e não os coloco no lugar de vítimas nem lá perto) ponto de vista de onde vos escrevo, o que vejo de mais vulnerável é o lugar do domador, do treinador de orcas ou do forcado, gente que aprendeu e acredita que o seu lugar na história está certo, que quer fazer bem o seu "trabalho". Estes vão ficar "desempregados" porque muita gente em muitos anos comprou bilhetes e os fez acreditar e desenvolver uma profissão de forma digna que lhes alimentou os filhos e os brilhos da roupa. 

A sociedade muda em grupo, em conjunto. Quando deixar de haver público e curiosidade pelo exótico a coisa muda. Hoje os programas de televisão sobre vida selvagem, a informação, os livros, a internet democratizam acessos e conteúdos.
Por exemplo, hoje as viagens para observação de baleias superam o volume de negócio da captura e transformação de cetáceos nos Açores e atraem mais pessoas e pessoas diferentes. Por isso, mais do que um post que expõe o nome de um homem (e que eu republiquei), que o condena pela morte de três orcas talvez não seja muito justo. É possível que este homem tenha sentido profunda dor pela perda, tal como de uma pessoa amada (quem nunca chorou a morte de um animal de estimação que atire a primeira pedra). 
Somos nós, público que temos de mudar, temos de deixar de ver espetáculos que atentam contra os direitos humanos, os direitos dos animais e a exploração da natureza e a mim parece-me que não estão só nos circos ou nos aquários gigantes. Se os espetáculos com aberrações humanas terminaram, se a mulher de barba ou os jovens de duas cabeças já não ganham dinheiro em barraquinhas de pano com franjas significa que estamos a fazer caminho e que o que aí vem será melhor. Mesmo com a convicção de que somos especialistas em encontrar e explorar aberrações novas e injustas a cada tempo.
Estejamos atentos e aprendamos juntos.  

Amor e pertença

Tudo o que amamos nos pertence. É uma pertença para a liberdade. Não é como as "coisas" que nos pertencem para a utilidade.  Os qu...